Uma sensação de estranhamento tomou conta de
meus pensamentos quando me dirigia para participar do Seminário "A
Comunicação Interna nas Melhores Empresas para se Trabalhar", realizado
pela Mega Brasil. Afinal, o que iria lá encontrar? A dúvida era justificável
porque eu havia experimentado a experiência profissional nesse campo nos anos
das décadas de oitenta e noventa, do século passado. Ou seja, muita água havia
passado por debaixo da ponte. As dúvidas também eram pertinentes porque as
novas e novíssimas ferramentas hoje disponíveis não eram nem sonho nas
corporações onde participei de processos de comunicação interna, interessantes,
vencedores e, claro, importantes.
No contato com as informações trazidas pelos
nove "cases" do Seminário, foi possível passar um filme na memória
profissional. De alguma forma, em muitas das experiências lá relatadas havia as
impressões digitais de ferramentas, processos e, principalmente conceitos então
utilizados. Quem não se lembra dos famosos Círculos de Controle da Qualidade,
importados da indústria japonesa, que foram aplicados à exaustão nas indústrias
e envolviam os funcionários para fazer melhor seu trabalho e participar
contribuindo com ideias e propostas para a melhoria geral do ambiente de
trabalho? Como se esquecer dos processos para a escolha dos chamados
"Operários Padrão" que mobilizavam o chão de fábrica e cuja
comunicação interna reportava em seus veículos de comunicação visando criar um
ambiente competitivo e harmonioso entre os candidatos da vez? O mesmo pode-se
dizer a respeito das Semanas de Segurança do Trabalho, Semanas de Meio
Ambiente, dia da Árvore, dia da Água, entre tantos outros motes mobilizadores
que tinham na comunicação interna uma importante ferramenta de envolvimento e
participação dos funcionários, patrocinados pelos departamentos ou gerências de
recursos humanos.
A comunicação interna era então realizada por
um conjunto de ferramentas viabilizado conforme fosse a verba disponibilizada.
A criatividade aqui era a regra. Mas enfim, havia os jornais murais, os
boletins internos, em alguns casos essas publicações ganhavam a forma de uma
revista interna. Em casos, onde a comunicação interna tinha alguma relevância,
havia mesmo os chamados conselhos editoriais envolvendo diversos setores das
empresas, cujos integrantes eram chamados a participar indicando temas,
assuntos, enfim, "pautas" para a edição seguinte. Os perfis de
funcionários, a história das empresas, seus pioneiros, as políticas de recursos
humanos, os futuros investimentos, tudo isso era matéria prima das publicações.
Contudo, havia sempre uma nuvem cinzenta
sobre as cabeças dos profissionais de comunicação e também sobre as gerências
ou diretorias de recursos humanos. Não havia muitos casos de amplo e perfeito
sucesso na comunicação interna e nem mesmo na comunicação empresarial com os
seus públicos alvos. As exceções confirmavam a regra. Isso é fato e pode ser
testemunhado por muitos profissionais das diversas áreas de comunicação que
sucumbiram ao sabor da primeira trovoada. Eu mesmo que vivi períodos dos
chamados "planos econômicos", de um país com inflação galopante e
ainda imberbe na vida democrática, vi sucumbir pelo menos dois projetos de
comunicação empresarial e consequentemente de comunicação interna no contexto
do Plano Collor, por exemplo.
A constatação era de que o trabalho estava
indo bem, os projetos vitoriosos e reconhecidos pelos públicos externos, com
prêmios, inclusive, mas diante das incertezas que se seguiram com a aventura do
caçador de marajás e sua ministra da economia, tudo ficava em suspenso. Desde
os planos de investimentos e ampliação da produção, até, programas de
comunicação institucional ou projetos de incentivo cultural, como o que assisti
ir para a lata do lixo, apesar de sua importância cultural e educativa e seu
desempenho na imprensa e prêmios.
Muita coisa evoluiu
E hoje como as coisas estão? O recorte que
trago a partir do "Guia Você S.A. -
As melhores Empresas para Trabalhar" são de um extrato do mundo
empresarial brasileiro, um recorte das maiores empresas, muitas delas,
multinacionais. O quadro revelado pelos profissionais de empresas como a
Telefônica/Vivo, Gerdau, Dupont, Votorantim Metais, Google, Elektro, Eurofarma,
Locaweb e Embraco, que deve ser replicado em tantas outras participantes do
certame promovido pela Revista Você S.A. indica que a comunicação interna vai
muito bem. O desafio, porém, é ampliar esse cenário para milhares de outras
empresas.
Aqui nos casos revelados as ações são
positivas, os veículos estão antenados com as realidades das empresas, existem
equipes enxutas, é claro, e as verbas nem sempre são as maiores. Contudo, o
conjunto de experiências relatadas, demonstra que as empresas, parece,
acordaram para a importância de ter o funcionário motivado, orgulhoso de trabalhar
na empresa e de participar do "time". O conceito de ter "orgulho
de pertencer", de "ser embaixador da marca" foram exaustivamente
repetidos nas exposições. Enfim, parece que existe uma quase certeza de que a
comunicação interna é um elemento importante para o ambiente das empresas e
consequentemente para os negócios.
Ficou claro que o tempo transcorrido entre as
três décadas que separam a nossa passagem pelo mundo da comunicação interna e
hoje, fizeram surgir muitas possibilidades e incremento da comunicação com os
colaboradores internos, embora, os house organs, os jornais murais e as
campanhas permaneçam com muita importância e eficácia. No dizer de muitos
palestrantes, são ferramentas e serão tanto mais úteis se bem utilizadas.
Adequar o conteúdo da comunicação e as
ferramentas ao tipo de empresa e público, portanto, permanece sendo o desafio
que nós lá no século XX já enfrentávamos. Como fazer chegar as mensagens às
unidades fabris distantes, descentralizadas ou aos públicos rurais das fazendas
que produziam os insumos para a produção industrial? Certamente o desafio
permanece, conforme foi muito bem demonstrado por muitos que vivem essa
realidade da descentralização das atividades produtivas. Há realidades cuja
comunicação digital é suficiente, porque a realidade da empresa e a cultura do
funcionário já não admitem o papel como veículo de transmissão de informações.
Mas, há realidades cuja impossibilidade do funcionário estar diante de um
computador, na linha de frente da atividade da empresa, cujo boletim impresso é
a ferramenta mais adequada.
Contudo, o que mais chamou a atenção e de
certa forma quebrou de vez com as minhas dúvidas quanto ao estado da arte da
comunicação interna, foi a exposição do representante do setor de comunicação
da empresa Google, que em dado momento fez a projeção de uma imagem de um
conjunto de pessoas em volta de uma fogueira e sentenciou que aquela continuava
a ser a melhor maneira de se comunicar entre as pessoas. Revelou que a prática
da reunião, da comunicação direta é enfaticamente utilizada na empresa de
comunicação digital pela internet. Essa mensagem em prol do "face to
face", aliás, foi apregoada por diversos dos participantes do evento. Isso
de certa forma reforçou um entendimento que sempre mantivemos aceso em nossas
atividades profissionais muito antes desses tempos de comunicação pela
internet. Sempre fomos partidários de que a transparência e envolvimento da
alta direção com os projetos e processos eram os mais importantes em todo o
processo de comunicação com os funcionários. Se isso continua prevalecendo,
valeu a semente que muitos milhares de pessoas envolvidas direta ou
indiretamente com os projetos de comunicação empresarial semearam no passado.
Paulo Antunes, jornalista com especialização
em educação ambiental, trabalhou com comunicação empresarial e comunicação
interna, jornalismo e comunicação ambiental e atualmente pesquisa a história do
cinema. E-mail: pauloantunes@uol.com.br