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Em breve... Em breve...

Marcia Tiburi conclama profissionais a assumirem a responsabilidade sobre o resgate do diálogo

Incomunicabilidade, desumanização, vazio da emoção, depressão. Os termos usados pela filósofa Márcia Tiburi para discorrer sobre a Ética, a Comunicação e o Cotidiano, tema da conferência de abertura do Seminário de Comunicação BB e Previ 2014, que a Mega Brasil Comunicação realiza durante esta semana, de 3 a 5 de novembro, no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro, revelam que a tecnologia adoeceu a sociedade, falta diálogo e é preciso resgatar a reflexão a tempo de reverter esse quadro.  Para ela, o papel dos comunicadores nesse processo é fundamental e urgente.

Para explicar como os três assuntos do tema da conferência se inter-relacionam, Tiburi citou Aristóteles ao dizer que o ser humano é, por natureza, um ser (animal) lógico e, portanto, político. É graças à linguagem, que ele entra em contato com outro e constitui a cidade, que, para os gregos representavam o lugar, mas sobretudo o jeito de como se constrói esse lugar, como se governa um povo.  Segundo o raciocínio aristotélico, o ser humano possui um modus de ser que envolve ainda o ethos, a menor base fundamental do cotidiano das pessoas.  E a responsabilidade da Comunicação, consequentemente dos meios de comunicação, em termos políticos é total.  "Será que eles (os meios) têm contribuído para o ódio ao outro, como o racismo, em detrimento da democracia? Qual a responsabilidade dos meios de comunicação em cima destas coisas todas do nosso cotidiano?", questionou a plateia formada em sua maioria por funcionários das áreas de comunicação do maior banco controlado pelo governo brasileiro e pela Previ, entidade ligada à previdência dos mesmos funcionários. 

Para a filósofa, se a comunicação é fundamental para a construção da democracia, há que se construir uma comunicação com ética, menos ligada à publicidade, tornando  a comunicação instrumento de debate e menos mercadoria. Para haver comunicação é necessário haver diálogo e Márcia acredita que a tecnologia  esvaziou o diálogo entre as pessoas. Citando o livro Bullshit ("Merda"), do filósofo Harry Frankfurt, ela exemplificou o atual momento em que se encontra a comunicação. "As pessoas cada vez mais falam muita coisa sem nexo, é o falar pelo falar, sem que isso seja diálogo. Ao mesmo tempo, falar sério caiu em desuso", disse. Márcia acredita que as pessoas estão gritando e sem noção de estarem em um campo social. "O clima não é mais o de defender calorosamente e de forma embasada uma ideia, mas da ignorância, que se escancara sem vergonha alguma", disse.    

A cura para o resgate do diálogo estaria na Filosofia.  "Devemos enfrentar com mais rigor as feridas de nossa época e isso tem a ver com a forma como temos nos comunicado e como temos feito a comunicação", reiterou, complementando que a responsabilidade também é das organizações, que representam a soma de singularidades em vazio de pensamento e emoção.

Márcia lembrou que a sociedade vive hoje uma epidemia de depressão. Segundo ela, estamos esvaziados de sentido, responsabilidade nossa, porque somos nós que temos que inventá-lo todos os dias. "Há uma ausência de sentido da vida, mas o que existe é nossa capacidade de inventar. Será que não nos alienamos de nós mesmos, de nossa própria expressão e pensamento?", provocou. "Será que não temos mais o livre exercício da linguagem? E a liberdade de imprensa, que não existe no Brasil, já que o que existe é uma comunicação que perdeu a ética porque virou mercadoria?" E foi aí que ela cobrou os presentes: "Continuamos muito mal informados, no meio da era da informação e é tudo isso que deve ser refletido e pensado pelos comunicadores, por quem faz a comunicação nas empresas, nas agências, nos jornais etc..

"Se as pessoas falam tanto sobre depressão, é porque isso está aí, acontecendo. E nós temos nos contentado com uma hiperprodutividade que se reverte em hiperconsumo.  E vai pro shopping, deprime e compra Prozac... A vida está besta e nós não merecemos isso.  Se hoje estamos na sociedade da ostentação é porque falhamos na comunicação em sociedade.  Isso nos torna mais ridículos, pequenos e infelizes, querendo nos matar de vergonha. A gente finge que não tem e ostenta. E isso tem a ver também com a experiência da falta de reflexão. Porque pensar pode doer para muitas pessoas, mas a falta de pensar é que deveria deixar alguém triste. E ter filosofia na vida pode ajudar esse processo", vaticinou.

O recado foi dado em todas as letras: "A falta de uso da nossa inteligência nos destrói como indivíduos e é isso o que precisamos refletir. Sendo comunicólogos,jornalistas, publicitários, RP, produtores, vocês devem pensar que a Comunicação é o cerne do relacionamento entre as pessoas, o que constitui a base da democracia. Isso precisa ser antecipado, na esfera do trabalho, na esfera da família... devemos refletir que o vazio do pensamento só vai acabar com nossa capacidade de pensar junto com os outros. Com diálogo." E ponto final!  



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